Sofia Lebron, estudante do curso de formação de professores de português da ENS Lenguas Vivas "Sofía Spangenberg" e responsável do projeto "La biblioteca de Sofia en Portugués", reflete neste artigo sobre a contribuição da literatura no ensino de português em relação à disponibilidade de títulos nas prateleiras.
Leituras que criam sentido
Por Sofia Lebron
Na Argentina há políticas educativas que propõem um diálogo intercultural entre a cultura própria e a que se estuda, neste caso a brasileira.
Outro dia eu estava na sala de aulas com a minha professora de Análise e redação de textos e com a minha colega Paula. Começamos a falar sobre a importância de conhecer a cultura da língua que se estuda e a conclusão foi, palavras da minha professora: "Quando se começa estudar outra cultura, começa-se a analisar a própria e descobre-se que não só se é da própria cultura, mas também se é da outra, a que se está estudando".
O ensino pragmático ativa um componente cognitivo: o afetivo, relacionado com o interesse, a empatia. Possibilita ao estudante ter uma interpretação a partir do ponto de vista cultural, o que lhe ajuda a se colocar no lugar do outro, ou seja adquirir a perspetiva do nativo da língua estrangeira.É por isso que eu me preocupei, quando vi que nas prateleiras das livrarias só havia livros gramaticais.
A abordagem na sala de aulas continua sendo estruturalista, sem ter opções de combiná-las com leituras que façam interagir a cultura própria, com a que se ensina, o que não permite dissipar estereótipos ou maus entendidos. A abordagem vira uma coisa estática com uma leitura estruturalista, a leitura é tratada como uma coisa estável, não havendo lugar para o leitor/produtor, formando leitores incapazes de participar na construção dos sentidos no discurso.
É certo que os professores na Argentina tentam incorporar leituras significativas, com estratégias pessoais: ficam horas, e horas procurando na internet. Criando uma sequência didática que leve aos alunos a desenvolver um estilo cognitivo que os liberte quebrando os estereótipos, mas fica só na vontade e no tempo que o professor tem para investir, porque não há -bom, não havia- oferta na Argentina no que a leitura se refere. Dependia da imaginação do professor para ativar a heurística do aluno. Só a vontade do professor podia maximizar as oportunidades de aprendizagem.
Eu procurei trazer para Argentina livros de literatura que criassem no leitor um sentido, o sentido que ele encontre, livre. O livro passa a ser uma unidade de significado. Dá espaço a interpretação a partir das referências do autor. Às vezes, o leitor descobre coisas, as ressignifica, já que a maneira de interpretação está associada à experiência e contexto pessoal de cada um, acrescentando assim um novo significado do que está lendo.
Os primeiros títulos que escolhi para disponibilizar na Argentina, são principalmente um convite ao diálogo com a cultura brasileira, sua origem, seus interesses. São portadores da tradição brasileira onde o aluno descobre o além das palavras isoladas, da gramática. Por exemplo o livro “Folclorices de brincar”, trabalhando a poesia, os alunos leem sobre brincadeiras tradicionais no Brasil. Uma delas, a pipa. A partir da pipa a criança começa a pensar como é a vida do menino que brinca de pipa na rua, e pode comparar com a própria. O leva a criar hipóteses, começa o inter diálogo entre sua cultura, seu contexto e a do menino que brinca de pipa.
Claro que há um acompanhamento de atividades que abrangem a parte gramatical e linguística, mas desde outro lugar onde o aluno se torna criador. Por exemplo, continuando com o livro FOLCLORICES DE BRINCAR, o aluno pode criar rimas com as brincadeiras que descobriram no livro e misturá-las com as próprias.
A partir daí o aluno cria um discurso, se ampliam as discussões na sala de aula, o que torna tudo mais rico na troca de ideias, sendo o ensino menos direcionado permitindo as colocações dos alunos criando um sentido no discurso.Um texto, além do jogo linguístico, deve envolver as regras históricas sociais e linguísticas. O leitor começa construir um sentido já que a leitura será um processo de produção de sentidos, criará hipóteses confrontando a própria cultura com a LE encontrando uma ressignificação não literal.
São apenas ideias para mostrar como muda o paradigma quando se tem material disponível nas prateleiras para trabalhar na sala de aula. diferentes!
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